APOSTAS EM PAUTA NO SENADO: OS RISCOS DO AUMENTO DA CARGA TRIBUTÁRIA PARA A SEGURANÇA JURÍDICA E O MERCADO REGULADO
17 de dez. de 2025

O Senado Federal analisará, provavelmente no dia 17 de dezembro de 2025, o Projeto de Lei nº 128/2025 que propõe, entre outros temas, a elevação gradual da tributação incidente sobre o setor de apostas regulamentadas no Brasil. Atualmente fixada em 12% (próximo ao padrão mundial), a alíquota poderá alcançar patamares significativamente mais elevados até 2028, havendo inclusive discussões que apontam para a possibilidade de chegar ao montante de 15%.
O debate sobre tributação é legítimo e necessário. No entanto, quando se trata de um setor recentemente regulado, intensivo em investimentos e ainda em fase de consolidação, a escolha do caminho exige cautela, análise técnica e visão de longo prazo.
Tributação elevada não significa, necessariamente, maior arrecadação
Um dos principais desafios enfrentados pelo mercado brasileiro de apostas é a expressiva presença de plataformas ilegais. Estima-se que cerca de 60% dos jogadores ainda utilizem operadores não autorizados, que atuam à margem da regulação, não recolhem tributos, não adotam políticas de jogo responsável e não oferecem qualquer proteção ao consumidor, conforme dados do Instituto Locomotiva e do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR).
Nesse contexto, elevar a carga tributária sobre operadores que já estão regularizados pode produzir um efeito contrário ao desejado. Em vez de ampliar a base de contribuintes, o aumento abrupto de impostos tende a reduzir a competitividade do mercado legal, desestimular novos investimentos e fortalecer o ecossistema ilegal (que opera sem custos regulatórios, sem fiscalização e sem responsabilidade institucional).
A experiência internacional demonstra que tributação eficiente não se confunde com tributação máxima. Países que obtiveram sucesso na consolidação de mercados regulados de apostas optaram por modelos equilibrados, capazes de arrecadar, proteger o consumidor e, sobretudo, reduzir de forma estrutural o espaço ocupado por operadores ilegais.
Impactos diretos sobre investimentos e segurança jurídica
A previsibilidade regulatória é um dos pilares da segurança jurídica. Operadores que ingressaram no mercado brasileiro o fizeram com base em um marco regulatório recente, que demandou investimentos significativos em tecnologia, compliance, prevenção à lavagem de dinheiro, governança, proteção de dados e estruturas operacionais locais.
Quando esse ambiente sofre alterações abruptas, especialmente no campo tributário, sem uma transição proporcional e previamente sinalizada, rompe-se a lógica de confiança que sustenta decisões de investimento de longo prazo. O efeito imediato não é apenas econômico, mas institucional: investidores passam a precificar o risco regulatório como um fator central, o que encarece operações, retrai novos aportes e reduz a disposição de empresas em expandir ou mesmo manter estruturas locais. Em última instância, a instabilidade normativa enfraquece o mercado regulado, favorece operadores ilegais (que não internalizam esses custos) e compromete o próprio objetivo do Estado de ampliar arrecadação, fiscalização e proteção ao consumidor.
Alterações relevantes na carga tributária, sem uma transição cuidadosamente calibrada, impactam diretamente decisões de investimento já tomadas. O efeito prático tende a ser a revisão de planos de expansão, a postergação de novos aportes e, em cenários mais sensíveis, a realocação de investimentos para jurisdições mais estáveis.
Para o Estado, isso significa menos arrecadação no médio e longo prazo, maior dificuldade de fiscalização e perda de competitividade regulatória. Para o mercado, representa insegurança jurídica e retração do ambiente de negócios. Para a sociedade, o resultado é o enfraquecimento do setor legal e o fortalecimento de operadores que não geram empregos, não pagam impostos e não oferecem qualquer garantia ao consumidor.
Empregos e impacto econômico: dados concretos
A indústria de jogos e apostas no Brasil deixou de ser um fenômeno marginal. Hoje, sustenta uma cadeia econômica ampla e transversal, que envolve tecnologia, meios de pagamento, marketing, publicidade, esportes, atendimento ao consumidor e serviços jurídicos e regulatórios especializados.
Os impactos sobre o emprego são expressivos. Apenas em 2025, o setor esteve entre os que mais geraram postos de trabalho no país. Segundo o estudo Panorama do Mercado de Apostas de Quota Fixa, elaborado pela LCA Consultores Econômica e pela Cruz Consulting, a pedido do IBJR e da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), os empregos diretos nas apostas legalizadas geram aproximadamente R$ 460 milhões por ano em massa salarial, além de R$ 87 milhões em encargos sociais destinados a sistemas de proteção social.
Qualquer medida que fragilize esse ecossistema afeta diretamente empregos formais, arrecadação previdenciária e a sustentabilidade de uma cadeia produtiva que ainda está em processo de amadurecimento.
O caminho para fortalecer o mercado legal
Fortalecer o mercado regulado não passa por penalizar quem optou pela legalidade. Pelo contrário: exige um ambiente tributário equilibrado, capaz de estimular a regularização, ampliar a base de contribuintes e reduzir, de forma estrutural, a atratividade do mercado ilegal.
Regulação inteligente é aquela que combina arrecadação, segurança jurídica, proteção ao consumidor e estímulo ao investimento responsável. Esse equilíbrio é fundamental para que o Brasil consolide um mercado de apostas sólido, seguro e sustentável, alinhado às melhores práticas internacionais.
Uma regulação inteligente não se constrói apenas pela elevação de impostos, mas pela combinação de uma tributação racional com fiscalização eficaz e mecanismos de controle bem estruturados. Modelos internacionais bem-sucedidos demonstram que alíquotas moderadas, associadas a uma supervisão rigorosa, sanções efetivas e instrumentos tecnológicos de monitoramento, são muito mais eficientes para garantir arrecadação contínua, combater a ilegalidade e proteger o consumidor. Quando o custo de operar dentro da lei é proporcional e previsível, o incentivo à regularização se fortalece e o mercado ilegal perde espaço de forma estrutural.
Além disso, uma fiscalização eficiente permite ao Estado concentrar esforços no que realmente importa: identificar operadores não autorizados, bloquear meios de pagamento irregulares, coibir publicidade ilegal e responsabilizar agentes que atuam à margem da legislação. Esse modelo reduz assimetrias concorrenciais, reforça a segurança jurídica e cria um ambiente mais saudável para investimentos responsáveis. Ao equilibrar tributação, fiscalização e previsibilidade normativa, o Brasil tem condições de consolidar um mercado de apostas sólido, seguro e sustentável, alinhado às melhores práticas internacionais e capaz de gerar benefícios econômicos e sociais duradouros.
O posicionamento da Octus
Na Octus, acompanhamos de perto a evolução normativa do setor de jogos e apostas e atuamos diariamente ao lado de operadores que escolheram o caminho da legalidade, da transparência e da responsabilidade institucional.
Defendemos uma regulação técnica, racional e orientada por dados concretos, que considere os impactos econômicos, sociais e concorrenciais das decisões legislativas. O debate tributário é necessário, mas deve estar conectado à realidade do mercado e atento aos riscos de decisões que, embora bem-intencionadas, possam gerar efeitos contraproducentes.
O Brasil ainda tem a oportunidade de fazer escolhas regulatórias que fortaleçam o mercado legal, ampliem a arrecadação de forma sustentável e protejam efetivamente o consumidor. Seguiremos contribuindo de forma técnica e responsável para esse diálogo, em defesa da segurança jurídica, do desenvolvimento econômico e dos interesses legítimos de nossos clientes e da sociedade.
Artigo redigido por Daniel Cruz Fonseca, advogado na Octus Consulting.



